01/02/2018

Como meu filme foi parar em dois festivais italianos


Em 15 de janeiro, anunciei aqui no blog que pela primeira vez um filme de minha autoria era selecionado para um festival fora do Brasil. Meu oitavo curta, Visitando os Tukano-Dessana, está entre os finalistas do Cefalù Film Festival, que acontece no segundo semestre em Palermo (Itália).

Exatos 15 dias depois, na terça, 30, o mesmo curta foi anunciado como semifinalista do STIFF - por extenso, o San Mauro Torinese International Film Festival, da cidade de San Mauro Torinese, região do Piemonte, também na Itália, programado para maio. Atualização 5.2.18: A lista dos finalistas ainda será divulgada, só então terei a confirmação de que meu filme será ou não exibido no STIFF. 

Jamais em minha vida imaginei que um filme feito sem grandes recursos (basta dizer que toda a captação foi feita com minha já aposentada câmera compacta Nikon S3500) poderia ter esta carreira internacional. De certo modo, posso dizer que editei o filme pensando nisso, em abril do ano passado, mas com o correr do tempo percebi que não seria algo muito simples. Mas também não é algo de outro mundo, né, do contrário eu não teria conseguido. Resolvi então neste textão contar pra vocês como tudo aconteceu.

O filme tem 13 minutos e 4 segundos de projeção, e menos de um quarto deste tempo tem o que se poderia chamar de diálogos. A rigor, há apenas uma frase em português, dita por um índio Tukano-Dessana que atua como uma espécie de mestre-de-cerimônias na aldeia que visitei em novembro de 2015, numa ilha do Rio Negro, próxima a Manaus, e o restante são cantos tradicionais desse povo. Na maior parte do tempo, porém, as danças apresentadas são ao som de flautas de variados formatos e tamanhos, além de alguma percussão, sem canto. 

Pensei então que tinha em mãos um bom material para festivais tanto no Brasil quanto no exterior, e comecei a inscrevê-lo em todos os festivais possíveis. De abril para cá, foram 116 inscrições apenas através de um site, o Film Freeway. Existem outros sites, como o Movibeta, o FestHome e o Click for Festivals, mas considero o Film Freeway mais amigável, além de ser o único que apresentou resultados positivos até o momento. Em tempo: poucos festivais brasileiros utilizam os serviços destes sites, então as dicas a seguir servem mais para quem quer ver seu trabalho exibido no exterior, OK? Sigamos. 

Não tem muito mistério. Você, tendo pelo menos um filme de sua autoria, pode criar uma conta nestes sites e subir todas as informações do filme (dá um certo trabalho no começo, mas isso permite que depois você se inscreva com muita facilidade). Concluído isto, você pode pesquisar os festivais que têm relação com o seu filme. No Film Freeway, você pode pesquisar usando alguns filtros - eu sempre pesquiso festivais com sessões presenciais e festivais online, que não cobrem inscrição e que aceitem documentários. Isto gera uma lista pela qual navego procurando os festivais mais interessantes pro meu filme. Aí bastam alguns cliques e pronto! Sites como os citados têm reduzido a exigência de envio de DVDs pelo Correio, com o risco de custar caro e demorar num envio para o exterior.

Alguns festivais só aceitam filmes sobre determinado tema, ou de diretores do próprio país, ou ainda com até determinada idade. Mesmo assim toda semana há dezenas de novos festivais cadastrados em cada uma das plataformas citadas. O Film Freeway tem uma área do diretor onde você pode ver todos os festivais onde se inscreveu e a atual situação em cada um deles, com cores facilitando uma rápida identificação.
  • A questão da cobrança por inscrição - algo raro no Brasil, praticamente uma praxe no exterior - pesa muito. É comum se cobrar algo em torno de 40 dólares por inscrição. Imaginem se eu fosse pagar 40 dólares para cada um destes 116 festivais - daria "apenas" R$ 14.694,88, pela cotação de hoje. Impensável. Lembrando que a inscrição é não-reembolsável: se seu filme não for selecionado, ou mesmo se você desistir de concorrer, este valor não lhe será devolvido. 

Uma coisa que constatei ao longo desses dez meses é que a questão das legendas é mesmo fundamental. Procurarei ficar atento a isto num futuro curta. Por ora, a meta é aproveitar a chamada 'janela' dos festivais - o período entre um a dois anos após a conclusão de um filme no qual os festivais aceitam sua inscrição. 

Enfim, viram como se inscrever não é nenhum mistério? Claro que ler bem em inglês ajuda (o Movibeta tem versão em espanhol, o FestHome tem versão em português, no caso dos outros o Google Translator taí pra dar aquela mãozinha esperta). Se você tem um ou mais filmes concluídos em 2017 ou mesmo este ano, considere a possibilidade de se cadastrar em ao menos um dos sites mencionados. Faça seu cadastro e depois é só acompanhar as newsletters semanais dos sites, sempre destacando festivais novos e aqueles que estão encerrando as inscrições. 

Pra finalizar, uma dica que ouvi no debate "Curadoria e Crítica nos Festivais - Experiências", do qual participaram os críticos e realizadores Camila Vieira e Eduardo Valente, durante a 8ª Mostra Sururu de Cinema Alagoano, no Centro Cultural Arte Pajuçara (Maceió), em 16 de dezembro de 2017. Diretor artístico do Festival de Brasília, Valente procurou desfazer a imagem negativa que os cineastas pudessem ter dos curadores de festivais - ao contrário do que possa parecer, os curadores apreciam, sim, e muito os filmes inscritos, a questão é que há uma seleção porque não é possível exibir tudo, e nessa seleção cada festival tem seus próprios critérios. Visitando os Tukano-Dessana, que mostra a visita de turistas a uma aldeia indígena, poderia por exemplo entrar num festival cujo tema seja o turismo, mas não em outro que tenha foco em filmes sobre gastronomia. Ser rejeitado por um festival não quer dizer que seu filme seja ruim ou você seja um péssimo cineasta, apenas naquele momento aquele não é o material adequado para o evento, na opinião de quem organiza o evento. Por isso, Eduardo Valente recomenda:

- Se inscrevam nos festivais, e de preferência se inscrevam tão logo abra o período de inscrições. 

Isto porque no início é mais fácil os curadores poderem avaliar com calma seu filme. Mas boa parte dos realizadores deixa pra se inscrever nos últimos dias - há festivais que recebem, no dia do encerramento das inscrições, exatos 50% de todos os filmes concorrentes, e aí já há bem menos tempo hábil para apreciações mais demoradas. 
#ficaadica



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